Execução. Decisão judicial para apresentação do contrato de serviços advocatícios. Providência com a finalidade de localizar o endereço do executado. Afronta às prerrogativas inerentes à advocacia. Violação do sigilo profissional.

Decisão judicial que determina a apresentação do contrato de serviços advocatícios, com a finalidade de verificação do endereço do cliente/executado, fere o direito à inviolabilidade e sigilo profissional da advocacia.

A advocacia é função essencial à administração da Justiça, reconhecida como tal no caput do art. 133 da CF/1988. A legítima exegese desse dispositivo constitucional é a que reconhece proteção ao exercício da advocacia e não ao advogado e, assim, a essencialidade própria do advogado se revela apenas “no contexto de aplicação do ordenamento jurídico, em atividade vinculada ao órgão jurisdicional atuando na reconstrução, e mais, na ressemantização democrática e participada das normas jurídicas aplicáveis ao caso concreto”.

Ademais, a garantia do sigilo profissional tem assento no art. 5º, inciso XIV, da CF/1988, que estabelece ser “assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional”.

O art. 7º, inciso II, do Estatuto da Advocacia, determina a inviolabilidade do escritório ou local de trabalho, bem como dos arquivos, dados, correspondências e comunicações, salvo hipótese de busca ou apreensão. E sobre o ponto, acrescenta a doutrina que “ainda que determinadas por ordem judicial, as interceptações telefônicas, previstas no art. 5º, inciso XI, da CF/1988, não podem violar direito à confidencialidade da comunicação entre advogado e cliente”.

Deve ser realçado, nesse ponto, pela relevância, que a redação do referido inciso II é fruto de alteração legislativa promovida pela Lei n. 11.767/2008. A partir da renovação operada por essa lei, o § 6º, do próprio art. 7°, regulamentou a ressalva prevista naquele inciso, detalhando melhor a matéria, prevendo expressamente as hipóteses em que a inviolabilidade poderia ser afastada.

De fato, anteriormente à publicação da Lei n. 11.767/2008, a doutrina entendia que o afastamento da inviolabilidade e realização de busca e apreensão em locais de trabalho do advogado somente era possível, desde que acompanhada por representante da OAB.

Entretanto, após a entrada em vigor da nova lei, para que seja removida a prerrogativa é necessário o preenchimento de certos requisitos: a) indícios de autoria e materialidade de crime praticado pelo próprio advogado; b) decretação da quebra da inviolabilidade por autoridade judiciária competente; c) decisão fundamentada de busca e apreensão que especifique o objeto da medida.

Aliás, pela mesma distinção, recorde-se que o sigilo profissional recebe amparo no Código Penal brasileiro (art. 154) e no Código de Processo Penal (art. 207), no sentido de que, em qualquer investigação que viole o sigilo entre o advogado e o cliente, viola-se não somente a intimidade dos profissionais envolvidos, mas o próprio direito de defesa e, em última análise, a democracia.

Noutro ponto, é conveniente assinalar que, como qualquer outro direito ou garantia fundamental, também a inviolabilidade e o sigilo profissional no âmbito do exercício da advocacia, mesmo ostentando tamanha envergadura, não são absolutos em prevalência, tendo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça exercido importante papel na definição das hipóteses em que é possível flexibilizar seu alcance, a partir de legítima e desejada ponderação de valores.

No caso, a determinação para apresentação do contrato de serviços advocatícios com a finalidade de localização do executado/cliente para expedição de mandado de penhora não configura justa causa para a suspensão das garantias constitucionalmente previstas. Assim, o contrato de prestação de serviços advocatícios, instrumento essencialmente produzido e referente à relação advogado/cliente, está sob a guarda do sigilo profissional, assim como se comunica a inviolabilidade da atividade advocatícia.

RMS 67.105-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 21/09/2021.

Fonte: STJ